
Sobre o Holocausto diz-se frequantemente que foi o periôdo mais negro da história da humanidade. Não questiono a validade dessa afirmação do ponto de vista das estatísticas.
O meu problema aqui é que, não se tratando de futebol, essa abordagem estatística da morte industrializada levanta-me alguns problemas.
Desde logo é preciso fazer uma ressalva: os números do genocídio são tão chocantes que a pílula não pode ser mesmo adocicada por uma pessoa decente.
É preciso também lembrar que nos fornos crematórios do holocausto não foram sacrificadso só Judeus. Foram também sacrificados ciganos e homosexuais. De quem mais me estou a esquecer?
O caso dos homosexuais é para mim de um ponto de vista histórico e moral [estranha combinação de palavras] particularmente emblemático, porque é sabido que algumas das pessoas que planearam o holocausto eram homosexuais. Entenda-se, do ponto de vista público eram senhores de bem casados e com filhos, mas depois tinham toda uma vida secreta que incluia ao mesmo tempo a practica de actos homosexuais e o sacrifício da vida de outras pessoas também elas homosexuais.
A ponte entre aquilo que relato no paragrafo anterior relativamente aos homosexuais e o que se passou com os Judeus é nos dada pela ficção, na "lista Schindler" de Steven Spielberg. No filme Schindler aposta num jogo de cartas com o director de um campo de concentração o direito de transportar consigo uma das suas "criadas". Este não quer aceder ao pedido para efectuar o tal "jogo". Schindler analisa a recusa da seguinte forma: "Tens vergonha de estar apaixonado por uma judia.". Do ponto de vista que a interpretação de Schindler cria é tentador dizer que até os carrascos do Holocausto escondiam dentro de si a possibilidade de fazer o Bem, isto assumindo que essa coisa difícil de definir a que chamamos paixão tem alguma coisa que ver com o bem. Esta última condição não é uma questão menor, porque no mesmo filme Schindler aproveita o Sabath para beijar todas as mulheres que trabalham na sua fábrica.
Admitir que "até os carrascos do Holocausto escondiam dentro de si a possibilidade de fazer o Bem", pode parecer deslocado e politicamente incorrecto. Na minha opinião é uma condição essencial para establecer a imputabilidade daqueles que fizeram o Holocausto. Ou poderiamos considerar aqueles que cometem um crime (seja ele qual for) imputáveis se estes forem desprovidos de conciência moral? A questão que aqui se coloca sempre é: porque é que individuos providos de consciência moral praticam actos imorais? Esta é no meu entender o fulcro sobre o qual balança a definição do conceito de Mal.
O outro receio que eu tenho quando se discute a questão do Holocausto é a tentação de cair numa excessiva culpabilização da nação Alemã daquele tempo. Não se trata aqui de pôr em questão a loucura colectiva que foi vivida durante esse periôdo da história na Alemanha nazi. Trata-se isso sim de perceber que o Holocausto não nos deve levar a questionar a Alemanha ou a nação Alemã, bem pelo contrário o Holocausto obriganos a questionar o que é a condição humana, o que somos nós e de que é feita a nossa própria carne.
Do ponto de vista enunciado no paragrafo anterior perder demasiado tempo a discutir o Holocausto pode até ser pernicioso, porque no futuro novos Holocaustos podem ter lugar. Desse ponto de vista a questão fulcral é saber como cada um de nós se comportaria sob o tipo de pressão que se gera nessas situações.
17 de fevereiro de 2006
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