O modo como a comunicação social (exemplo típico: o relato épico-lírico de um jornalista da RTP no noticiário das 20 horas de ontem) está a tratar o crime cometido no Porto contra alguém que se encontrava na maior das solidões, da perda de si, o que também significa na margem mais absoluta da exclusão, é um típico exemplo de jornalismo de causas, ou seja, de não-jornalismo. Duvido que sequer sirva qualquer causa, serve uma determinada visão política do problema e da sociedade, a do Bloco de Esquerda. Penso aliás que é absolutamente contraproducente para uma sociedade que aceite a pluralidade das escolhas de vida com naturalidade, que é o que desejamos. (Pacheco Pereira no Abrupto)
Concordo com aquilo que o Pacheco Pereira diz - em parte. Na imprensa escrita a separação entre os espaços de informação e de opinião é uma regra bem estabelecida nas redacções dos jornais de referência. Na televisão essa separação é por natureza mais difícil de fazer. Infelizmente aquilo a que temos assistido é ao estabelecimento da informação espectáculo em que o apelo deliberado e explícito ao sentimento são a regra. Parece-me que, no caso de um crime deste tipo, isto é particularmente mais grave porque a natureza do próprio crime é tão grave que é desnecessário o apelo ao sentimento; direi que se o espectador ficar indiferente a uma notícia meramente factual, algo de errado se passa. Algo de errado se passa com o espectador. Será que é esse o problema? Será que nas redacções da RTP (e da TVI) aquilo que se assume é que os espectadores têm os seus sentimentos de tal modo embutidos que é preciso esfregar-lhes com a miséria humana na cara para obter deles uma reacção?
Onde me parece que o Pacheco Pereira erra é justamente na interpretação do estado de coisas anteriormente descrito. Ele vê ali um favorecimento da agenda política do Bloco de Esquerda. Será que o Pacheco Pereira não sabe que nestas matérias a biografia individual é provavelmente mais relevante do que o posicionamento partidário?
Convem a este propósito lembrar que hoje em dia há quem defenda que o conceito de identidade sexual do indivíduo não faz sentido. De acordo com esses pensadores aquilo que pode ser definido como homosexual, heterosexual ou bisexual são actos sexuais. O Pacheco Pereira não parece querer saber de nada disso, o que num plano puramente individual é uma opção tão respeitável como outra qualquer.
25 de fevereiro de 2006
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3 comentários:
Sinceramente, ate gostei da forma como os jornais estao a lidar com o caso. Em relacao as TVs nao posso dizer: n tebho visto.
Confesso que a referência aos jornais era mais para estabelecer uma comparação entre o estado de coisas na televisão e na imprensa escrita de referência, sem pensar neste caso em particular. Mas a especialista és tu e não eu.
"Espercialista" não! Interessada, sim!
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