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Chamada de atenção para o debate que decorre nesta caixa de comentários entre a abrunho e a Cristina Silva. Eu ultimamente ando tão chalado que prefiro estar calado.
A voz às damas.
Chamada de atenção para o debate que decorre nesta caixa de comentários entre a abrunho e a Cristina Silva. Eu ultimamente ando tão chalado que prefiro estar calado.
A voz às damas.
à(s)
11:30
14 comentários:
'ehh lá, adrenalida em alta..
sem KO's técnicos nem desclassificações acho que ficamos por um empate.. penso não falar só por mim quando digo que estamos todos ansiosos pela "negra"...'
(E eu que achava que a discussão na ciência nos dias de hoje centravam-se unicamente entre a discussão entre ciências exactas e ciências sociais, ou quanto a métodos.)
Parece-me crucial introduzir nesta longa discussão esse grande génio que é Kant que escreveu a “CRP” precisamente para delimitar estes dois campos do saber, (aqui explícitos nesta longa discussão) – ciência e metafísica. “No prefácio Kant dá-nos as razoes pelas quais empreendeu tal investigação: diz-nos que a razão humana está destinada a ser atormentada por questões metafísicas, e é vão afectar indiferença perante elas. No entanto a metafísica esgota-se em controvérsias e não apresenta nenhum progresso. Ela parece não ter entrado no caminho seguro da ciência, ao contrário do que se passa com outros saberes.
A razão desta situação é o facto de os metafísicos procurarem obter conhecimento de objectos que não são dados na experiência, objectos como Deus e a Alma, e para esta entrar no caminho seguro da ciência ela deverá ocupar-se com os objectos da experiência possível, pelo que a “metafísica transcendente” deverá simplesmente acabar. Os exemplos dos movimentos problemáticos deste tipo de pensamento com que os metafísicos se comprometem são: tomar a simplicidade lógica do pensamento do eu por conhecimento de uma alma simples, imaterial e imortal; pensar que a ideia de um fundamento de toda a possibilidade é equivalente ao conhecimento da existência necessária de tal fundamento.”
Aceitar uma explicação de criação do mundo em 7 dias parece-me totalmente disparatado perante as evidências que o conhecimento cientifico nos tráz.
Mais que “compartilhável” o conhecimento produzido pela ciência é universal, e não me parece haver qualquer problemática no reconhecimento das suas conclusões. Se a Cristina em qualquer parte do planeta se atirar de uma janela ou de outro sitio qualquer, verá que a lei da gravidade não deixa lugar para qualquer discussão quanto ao “reconhecimento das suas conclusões”, por mais que lhe garantam que a mão de Deus lá estará para a segurar.
Temo que esta exposição seja demasiado sucinta para a problemática em questão, mas o meu tempo não mais me permite.
«Se a Cristina em qualquer parte do planeta se atirar de uma janela ou de outro sitio qualquer, verá que a lei da gravidade não deixa lugar para qualquer discussão quanto ao “reconhecimento das suas conclusões”, por mais que lhe garantam que a mão de Deus lá estará para a segurar.»
Este tipo de argumento parece-me demasiado sério para não ser analisado com cuidado. Este tipo de argumentos surge frequentemente quando é discutida a questão do livre arbítrio.
Consta que na grécia antiga dois filósofos argumentavam na ágora sobre a existência ou não do livre arbítrio, uma vez que a discussão estava num impasse o partidário do livre arbítrio disse ao seu oponente: "Vês este pau? Vou bater-te com ele até que acredites no livre arbítrio." E assim fez. Consta que a estratégia "argumentativa" resultou. Note-se que se trata apenas de um episódio "anedótico", no entanto parece-me que abre graves precedentes como procurarei mostrar.
Antes das considerações que farei em seguida gostaria de lembrar que o conceito de livre arbítrio está minado de contradições. O livre arbítrio por um lado exige o determinismo, para que uma vez que o individuo toma uma decisão a possa implementar num mundo minimamente previsível. Por outro lado o livre arbítrio exige uma quebra desse mesmo determinismo no momento em que individuo toma uma decisão "livre", pois o cerne do arbítrio do individuo é a sua capacidade de tomar uma decisão livre de constrangimentos que lhe sejam exteriores.
Voltando à historieta da ágora, no meu entender a historieta só funciona porque o que está em discussão (explicitamente) é o livre arbítrio podendo a ameaça física funcionar como uma hipotética prova do livre arbítrio. Se o objecto da discussão fosse outro tornava-se óbvio que a violência (física neste caso) é um puro instrumento de chantagem, existem outros mais comuns como o argumento de autoridade (com ou sem Deus à mistura).
Sob risco de me tornar repetitivo, chamo a atenção para o facto do exemplo que aqui trouxe ser na aparência improvável e anedótico, mas no meu entender ele é bastante relevante.
Nem sei bem porque é que me lembrei disto, eu no fundo até concordo com o que a heloisa diz, parece-me que está apenas a querer trazer alguma racionalidade à discussão.
Termino com uma pergunta: "No prefácio Kant diz-nos que a razão humana está destinada a ser atormentada por questões metafísicas." Porque será?
A minha exposição precedente focava-se na questão:
“Como se determina que o assunto é científico e que, por isso, não é mais passível de discussão teísta?”
E penso que ficou claro na minha breve exposição apoiada em Kant que o conhecimento metafísico ou transcendente, ao contrário da Física (por exemplo) não consegue encontrar o caminho do conhecimento seguro e digno de crédito. E apesar de um dos objectivos da CRP ser o da preservação da liberdade por oposição à causalidade natural que rege os fenómenos, o exemplo que o Luís referiu era só para demonstrar a indubitabilidade do conhecimento cientifico, neste caso da física, onde não existe espaço para a discussão teísta.
Quanto à ultima questão que coloca o que posso responder é que Kant por não negar que as questões metafísicas: Deus, liberdade e imortalidade da alma, são um “destino singular da razão humana”, é que demonstra o que a metafísica não pode ser - uma ciência - para mostrar o que ela pode ser – uma crença ou fé racional com razões ou justificações de ordem moral.
Lamento não poder alongar-me mais, mas se quiser aprofundar mais esta questão kantiana nada melhor que perguntar a Kant, que até é um senhor muito simpático e claro nas argumentações que faz, ao contrário do que o costumam pintar.
Gostei de andar por cá…
PS: Nessa questão sobre o livre arbítrio ainda pode ser introduzida a discussão dos medievais centrada na omnisciência divina articulada com o livre arbítrio dos indivíduos, (que me parece não menos anedótica que o exemplo do pau).
"E apesar de um dos objectivos da CRP ser o da preservação da liberdade por oposição à causalidade natural que rege os fenómenos, o exemplo que o Luís referiu era só para demonstrar a indubitabilidade do conhecimento cientifico, neste caso da física, onde não existe espaço para a discussão teísta."
Eu percebi o seu argumento, não se iluda com o meu fogo de artifício.
"PS: Nessa questão sobre o livre arbítrio ainda pode ser introduzida a discussão dos medievais centrada na omnisciência divina articulada com o livre arbítrio dos indivíduos, (que me parece não menos anedótica que o exemplo do pau)."
Confesso que me deixou curioso, não sei bem sobre o que está a falar, mas li em tempos algo que poderia estar relacionado com o que diz, mas sem referir Deus. A ideia é que a informação de todos os eventos que acontecem no tempo estão gravadas numa espécie de livro do universo onde tudo está já determinado. O paradoxo surge quando se quer "salvar" o livre arbítrio nesse contexto. Acertei? Se acertei, como é que na Idade Média é apresentada a coisa?
No fundo o problema é muito parecido com o que teriamos num sistema clássico determinista, dadas as posições e velocidades das partículas num instante, usando as leis de Newton é possível escrever o tal livro do universo.
É engraçado como uma hipotética física omnipotente nos leva a paradoxos idênticos aos que a teologia cria, embora a física Newtoniana não tenha nada de teológico. Será que as entidades teistas entram por portas travessas na ciência? Como? Poderá a ciência transformar-se numa espécie de religião?
Estou completamente confusa com a vossa discussao.
A heloisa escreveu, referindo-se sempre aos pensamentos do Kant (presumo) a "metafisica transcendente" devera simplesmente acabar. no primeiro comentario. No segundo escreveu Kant por não negar que as questões metafísicas: Deus, liberdade e imortalidade da alma, são um “destino singular da razão humana”, é que demonstra o que a metafísica não pode ser - uma ciência - para mostrar o que ela pode ser – uma crença ou fé racional com razões ou justificações de ordem moral.
Entao o Kant, sim ou sopas?
Nao percebi, Luis, o porque da inclusao do livre arbitrio na discussao, ainda que a sua sobreposicao ao sistema fisico classico seja divertida.
Ja' li sobre estudos cientificos que se debrucam na essencialidade da religiao no logos do ser humano. Meteram a evolucao ao barulho, a religiao como fenomeno agregador e motivador de cooperacao benefica 'a especie. A ver...
Podera a ciencia transformar-se numa especie de religiao? Isto dava para poste. :-)
Abrunho:
Quanto à última pergunta penso que pode, pensa por exemplo no ambiente que se gerou quando foi descoberto HIV-Sida, caiu um santinho no altar da ciência. Fez-se muito progresso desde essa altura, mas cura nem vê-la e a medicação continua demasiado cara para chegar ao 3º mundo.
Outra coisa que me preocupa quando se fala em Deus no contexto da ciência é a possibilidade de usar nome de Deus para dar cobertura ao culto de personalidade. Mas isso na religião Cristã até já está resolvido: há um mandamento que proíbe a coisa. No entanto há gente que em nome da religião contiua por exemplo a pedir um lugar especial para o ser humano: Teoria da Evolução das Espécies? Não senhora, tomem lá com Nosso Senhor Jesus Cristo Todo Poderoso que criou o Homem à sua imagem e semelhança.
Eu nao disse que a pergunta nao pode ser feita. Ao contrario, eu acho que e' uma pergunta que da' pano para mangas.
A forma como eu estou a ver a pergunta nao e' a mesma que a tua (mas tu andas sempre na gincana). Ha' a visao da ciencia como entidade toda poderosa que ninguem pode desautorizar, verdade suprema. A ciencia da-nos respostas o mais fundamentadas que existem. Mas a sua divinizacao nao seria saudavel para a necessaria e saudavel liberdade de pensamento e exercicio critico.
Depois ha' a agora muito badalada teoria das cordas cujos praticantes sao acusados de uma busca ao nivel de procura apostolica religiosa.
EStava a pensar nestes termos.
Ausencia de Dios
Digamos que te alejas definitivamente
hacia el pozo de olvido que prefieres,
pero la mejor parte de tu espacio,
en realidad la única constante de tu espacio,
quedará para siempre en mí, doliente,
persuadida, frustrada, silenciosa,
quedará en mí tu corazón inerte y sustancial,
tu corazón de una promesa única
en mí que estoy enteramente solo sobreviviéndote.
Después de ese dolor redondo y eficaz,
pacientemente agrio, de invencible ternura,
ya no importa que use tu insoportable ausencia
ni que me atreva a preguntar si cabes
como siempre en una palabra.
Lo cierto es que ahora ya no estás en mi noche
desgarradoramente idéntica a las otras
que repetí buscándote, rodeándote.
Hay solamente un eco irremediable
de mi voz como niño, esa que no sabía.
Ahora qué miedo inútil, qué vergüenza
no tener oración para morder,
no tener fe para clavar las uñas,
no tener nada más que la noche,
saber que Dios se muere, se resbala,
que Dios retrocede con los brazos cerrados,
con los labios cerrados, con la niebla,
como un campanario atrozmente en ruinas
que desandará siglos de ceniza.
Es tarde. Sin embargo yo daría
todos los juramentos y las lluvias,
las paredes con insultos y mimos,
las ventanas de invierno, el mar a veces,
por no tener corazón en mí,
tu corazón inevitable y doloroso
en mí que estoy enteramente solo
sobreviviéndote.
Mario Benedetti
Acho que em parte foi nessas linhas que interpretei a tua resposta.
"Depois ha' a agora muito badalada teoria das cordas cujos praticantes sao acusados de uma busca ao nivel de procura apostolica religiosa."
Também os há sensatos. E por enquanto não acho que seja muito frequente discutir teologia nas revistas científicas, depois há é uns malucos que têm uns blogues, umas webpages, falam para os jornais para a televisão, aí pode muito bem valer tudo. E para as entidades financiadoras então nem te digo nem te conto, o que é importante é as key-words e saber de que instituição é o gajo que tem que aprovar aquilo.
Eu às vezes sonho em criar um blogue em Inglês só sobre ciência pura e dura, mas e disciplina onde é que a arranjo?
Tambem seria uma ideia de blogue interessantissima para mim. Nao sei e' se me apeteceria escrever em ingles. Ja' me basta.
Uma vez estava em casa de um familiar meu com uns amigos e um jovem a arranjar um computador, e decidimos discutir se quem não reza o Pai Nosso e a Avé Maria com as letras todas reza ou não de outra forma. Isto ao mesmo tempo que um tipo estava a tentar instalar o Windows NT 4.0 num computador, e o hardware não tinha muita vontade de cooperar, até que alguém acrescenta com ironia: "Todos rezam, especialmente os engenheiros informáticos quando estão a lidar com um sistema operativo que não coopera."
Abrunho:
Quando Kant refere que a metafísica transcendental deve acabar é no sentido de que esta tinha a pretensão fundamental de constituir-se como conhecimento científico de realidades que estão para lá da experiência, e atribuía à razão um poder ilimitado para fundamentar o conhecimento em verdades eternas. O que ele vem dizer é: meus senhores isto é tudo muito bonito, mas vamos lá perguntar: que posso eu conhecer e que condições tornam possível o conhecimento cientifico? Ok, eu não nego que as questões metafísicas são inerentes ao homem, mas não é por isso que ela é o fundamento do conhecimento do mundo fenoménico.
Atenção que estou para aqui a apresentar ideias Kantianas de uma forma muito empobrecida, até porque são ideias de um sistema filosófico.
De qualquer forma, penso que ficou implícito nesses meus comentários a minha total concordância com as suas posições na discussão precedente.
Luís:
Sim, discussão pode-se dizer análoga a essa, só que substituindo o grande livro por Deus: sendo Deus omnisciente, como pode o homem ser dotado de livre arbítrio se tudo está previamente determinado na consciência desse grande senhor. A grande questão era que, assim sendo, como pode o homem ser castigado pelas suas acções, se estas já estavam pré determinadas por Deus.
É claro que, (a meu ver) saíram daí argumentos, que no mínimo davam um filme dos Monty Python.
Mas como diz um meu professor “Deus filosoficamente determinado não passa de um gambozino”.
Poderá a ciência transformar-se numa espécie de religião?
A mim parece-me que na sociedade contemporânea assistimos a um tipo “deificação da ciência”, precisamente pelo argumento que usou de que “Há a visão da ciência como entidade toda poderosa” que muita pouca gente se atreve a desautorizar.
Quanto a este assunto existe um livro do já ido Fernando Gil, “A ciência tal e qual se faz e o problema da objectividade”, que é uma compilação de uma série de conferências de uns fulanos desde matemáticos, epistemólogos, historiadores, filósofos, etc, que mandam umas papaias sobre ciência, algumas delas interessantes. Mas provavelmente já têm conhecimento deste livro, uma vez que me parece, pelo vosso diálogo, que ciência é a vossa área.
PS: será que alguém me empresta, vende “imposturas intelectuais” de Alan Sokal e Jean Bricmont, pois já corri tudo e mais um par de botas, e não encontro o raio do livro.
se quiseres esperar pelo natal eu posso-to emprestar
manda morada para abrunheiros@googlemail.com.
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