20 de janeiro de 2007

Gostaria de relatar o caso de um homem meu vizinho, a fazer 50 anos, o qual sofre de paralisia cerebral.
Chamar-lhe-ei António. Sempre o conheci uma criança, pela mão da mãe, que pouco pode trazê-lo à rua: ele embaraça-nos. Moro nesta zona há 23 anos, e há 23 anos que o António vai de manhã para o centro de convívio, e regressa à tardinha(...).
O António é uma criança com corpo de homem, e irreprimível desejo humano; privado de discernimento sobre o que é socialmente aceitável, qualquer mulher é um alvo. Quando nos encontramos, no curto percurso que faz com a mãe até à carrinha, ou regressado dela, o António apanha-me, abraça-me e lambuza-me, perante a nossa impotência. Nenhuma de nós tem força para impedir os enormes, fortíssimos abraços do António. Eu não sou a única vítima das suas pulsões sexuais, das quais me desembaraço o melhor que consigo, tentando acalmá-lo, e desproblematizando a questão perante a mãe, que se desfaz em desculpas. Da janela apercebo-me que isto acontece com outras vizinhas. O António quer beijinhos, muitos beijinhos e abraços, porque o António tem 50 anos e o seu corpo é sexuado e insatisfeito. Sofre intensas crises de natureza sexual, tornando-se muito agressivo, e difícil de controlar, mesmo em casa. Pelo que conheço da situação, sei que se os pais do António tivessem podido amputá-lo da sua sexualidade, tê-lo-iam feito para bem de todos.
A dignidade humana também deveria passar pela protecção contra o sofrimento inútil, quando é causado pela impossibilidade de acesso à satisfação de uma necessidade socialmente vedada.

Manipular as funções de um corpo para lhe causar maior bem-estar será algo tão censurável? Manipulá-lo para seu conforto, como se amputa uma parte do corpo cuja doença nos poderá ser fatal? O António, bem como os seus familiares, teriam uma vida melhor, se o seu quotidiano não fosse dominado pela necessidade sexual. Isto pode dar vontade de rir a quem seja alheio ao caso, mas não tem graça alguma: o António tenta violar as mulheres que existem em sua casa, as que aí vão, as da família; no entanto, o António, que tem 50 anos, mal fala, mal anda, e tem uma idade real de dois anos.

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