13 de maio de 2007

A geração de sessenta vista por JPP

Este blogue ultimamente anda muito JPPiano, mas esta crónica do JPP é muito interessante. No entanto discordo em absoluto dele quando afirma que o fenómeno aqui descrito é um fenómeno específico da geração dele. Basta ler a blogosfera (especialmente a de esquerda) para perceber que o fenómeno aqui descrito não é geracional, pelo contrário atravessa transversalmente a pirâmide etária.

(Bold meu)

O livro de Jorge Silva Melo (JSM) , Século Passado, é, sob a forma de uma compilação de crónicas, textos de circunstância, fragmentos por publicar, um livro de memórias, quase uma autobiografia. (...)

O que é que se sabe quando se sabe demais? Sabe-se de menos. Não no sentido socrático do “só sei que nada sei”, mas no sentido de que há “saberes” que se perdem, a começar pelo da inocência. O dilema da minha geração, que é fácil reconhecer neste livro, é que ao mesmo tempo que se queria saber tudo (e durante uns anos poder tudo), não se queria perder a inocência, vivia-se na nostalgia de um mundo perfeito e original, que conheciamos dos livros e do cinema, mas que éramos incapazes de sentir, só de “imaginar e ficcionar”. Por isso, a geração dos anos sessenta foi ao mesmo tempo incapaz de ter emoções simples, de ser “genuína” e de ter frieza na razão, de ser cínica. Voltou-se para a utopia, essa perigosa procura de perfeição. Nunca produziu verdadeiros casos de gente a “falar como eu respiro”, nem de cínicos, mesmo depois de velhos, porque é uma geração que envelhece mal. As suas criações ficaram sempre nesse hiato de dois desejos, desses mundos do perfeito sentimento e da perfeita racionalidade, que procurava com afinco, para ser o que não era. Sabia demais. Acabou por isso por mudar mais a história do que a criação, mais a vida quotidiana do que a poética, mais os outros do que a si própria.

(...) O resultado é egotista, solipsista, solitário, quase autista, como as significativas fotografias do autor no fim do livro, onde havendo ocasionalmente outras pessoas, não há mesmo mais nenhuma a não ser JSM representando-se.

(...)

Relatando um encontro forçado no Nicola, com um daqueles personagens que nos falam obrigando-nos a ouvir, num monólogo obssessivo sobre o destino do mundo e as múltiplas conspirações desse mesmo destino, JSM encontra-se com um homem da sua idade, do seu tempo, da sua geração e acima de tudo com a suas referências. Face a esse personagem, que no fundo lhe quer pedir dinheiro e tentar vender uma jóia para jogar, é como se nós nos vissemos num espelho, um espelho indesejado. E se o nosso destino, fosse esse? E se visto de fora, de longe, do tempo, fosse esse o nosso balanço – uma jóia para vender, uma mendicância difícil de recusar porque é pedida por um dos nossos, um discurso desconexo cheio de nomes e memórias, mas sem verdadeiro sentido? Disto a “cultura” não nos defende. Em boa verdade, a vida também não.

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