23 de março de 2006



O meu filme favorito sobre a segunda guerra mundial é o Underground de Emir Kusturica. O que me atrai no filme não é o filme de guerra, mas sim o retrato da loucura e do seu equivalente sociológico. A loucura pode ser caracterizada como o corte com a realidade exterior, isto é tanto verdade para as relações do individuo com o outro como para as relações do grupo com o mundo exterior.

O bunker do Underground é uma metáfora da loucura. Num dos momentos mais magistrais da cinematografia é o tiro de artilharia de um macaco(sim de um macaco) que abre o bunker ao mundo exterior.

Já sobre o holocausto o meu filme preferido é O Pianista, pese embora o facto de gostar também bastante da Lista de Schindler. No caso do pianista li também o livro em que se baseia o filme, escrito por Wladyslaw Szpilman contando a sua vida quer no gueto de Varsóvia quer enquanto fugitivo aos campos de concentração.

O que me agrada n'O Pianista é justamente a violência. A violência de ver as pessoas a tropessarem em cadáveres nas ruas do gueto de Varsóvia. A violência da mãe judia que à hora de jantar avisa os filhos que não quer ouvir mais anedotas de judeus, quando a situação no gueto estava a degenerar definitivamente. Nessa noite a mesma família vê no prédio à sua frente um oficial SS atirar janela abaixo um judeu paraplégico na sua cadeira de rodas. Lembro-me de referir esta cena ao meu tio, também ele deficiente, como prova de que o filme era excepcionalmente violento, coisa com que ele não parecia comcordar numa primeira discussão.

O filme tem outros elementos, que eu não caracterizaria como redentores, mas que oferecem sem dúvida um contraponto. Citaria em particular a vontade da família Szpilman ser deportada em conjunto independentemente do sítio onde essa vontade os levasse, e vale a pena dizer que duvido que a um nível subconsciente tivessem muitas dúvidas sobre a natureza desse sítio.

O filme tem outras formas de violência, estou a pensar em particular na presença no gueto dos zonder commando judeus. Eram eles que conduziam a multidão de judeus para os vagões de comboio, a fim de serem deportados para os campos de extermínio. Querer circunscrever a maldade do holocausto ao lado alemão e aos seus aliados é uma pura ilusão, pois alguns judeus não pareciam hesitar em colaborar no o extermínio do seu próprio povo. Curiosamente na Lista de Schindler o oficial judeu que dirige os zonder commando acaba pos se suicidar, é caso para perguntar a troco de quê ele aceitou tornar-se igual aos SS alemães.

3 comentários:

Anónimo disse...

Relativamenta à Lista de Shindler, qq referência que faça, não pode esquecer que é um filme politicamente correcto, apesar de baseado em facto verídico, a vida de Oskar Shindler. A interrogação q faz relativamente ao oficial judeu deve corresponder exactamente à pergunta que o SS (Steven Spielberg - teve piada) quer que faça. O drama do filme encarrega-se de lhe dar a resposta.

O que eu quero dizer é que na maioria dos filmes sobre o holocausto se ocultam ou branqueiam, por escrúpulo e outros motivos diversos, certos comportamentos que não têm a ver com a natureza étnica do povo judeu mas com a sua natureza humana e que podem comprometer a sua aureola de vítimização e ilibar o carrasco nazi.

O que os nazis fizeram com os judeus, foi reduzi-los, enquantos humanos, à sua natureza mais básica, despojando-os dos valores, primeiro do material e depois do moral em que, finalmente, a prioridade de cada um era a sobrevivência. E a esse nível vale tudo: a mentira, a traição, a denúncia, etc. Pelo suicídio do personagem, SS recupera a dignidade do povo judeu q mais uma vez tem que se aniquilar para poder existir, ainda como consequência e culpa do carrasco nazi. Pode muito bem ter sido nesta simbologia, mais ou menos consciente que SS desenhou o filme. Pelo menos foi assim que eu interpretei.

Cumprimentos

Anónimo disse...

Faz sentido de facto.

cumprimentos

abrunho disse...

Não leio o "Underground" como um filme sobre a II Guerra Mundial, mas sobre a psicologia de povos. Kusturica pinta a Jugoslávia.

O meu filme preferido sobre o holocausto é "A vida é bela" do Roberto Benigni. A mistura de elementos é explosiva e não há outro filme em que se sinta tão bem o absurdo, o desespero, o amor, o sacrifício, a crueldade, a negação.

"A lista de Schindler" e "O pianista" senti-os como um exercício competente de colocar em imagens o que já sabemos dos livros e dos museus. Foi "A vida é bela" que me fez sentir um nó tremendo na garganta.

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