14 de março de 2007

O Vasco voltou em grande à Memória Inventada

Nos regressos ao país há a explicação oficial, a explicação íntima e a explicação verdadeira. É raro coincidirem. A explicação oficial seria algo como: regresso porque tenho saudades da família, da namorada, dos amigos, de Lisboa, de Portugal. Ou uma explicação oficial mais poética: regresso porque em nenhum outro lugar a minha memória é tão afagada quotidianamente. Ainda oficial e algo pacóvia: regresso porque tenho um futuro mais promissor em Portugal. A explicação íntima, que se partilha com um ou dois confidentes, geralmente é uma versão das anteriores mas com o elemento da dúvida. E a explicação verdadeira eu não sei qual seria.

A explicação oficial é quase sempre profundamente mentirosa. Não chega a ser imoral, sobretudo se é em resposta a uma pergunta. Quando em vez de "mete-te na tua vida" se diz "voltei porque o país precisa de mim", o que é uma mentira que nos cobre de ridículo, preserva-se alguma boa educação. Não tem muita importância. Pior é quando se responde que se regressa por causa de uma pessoa. As intenções até podem ser as melhores e por vezes é verdade, mas ninguém tem de suportar o fardo do retornado. Dizer que se regressa por uma pessoa é torná-la refém dos nossos fracassos futuros, uma profunda injustiça e um erro estratégico. Esta é a explicação verdadeira que nunca pode passar a explicação oficial e que nem na intimidade se deve arriscar.

Parte da motivação para regressar explica-se simplesmente pelo desejo de mudança. Nunca se regressa para o mesmo, ainda que seja o mesmo lugar. Há também sempre um lado de desesperança, de desistência, sobretudo para quem realmente saiu e em alguma altura considerou não voltar. A mágoa do salto que fracassou deve ser mais pesada que a frustração de nunca se ter sequer tentado o salto, mas agrada-me pensar que o instinto de sobrevivência mais depressa faz esquecer a primeira do que a segunda.

Haverá talvez uma lista de razões para se regressar, mas só um espírito pateticamente organizado as sente somando uma a seguir a outra. Isolar a razão verdadeira, que nunca é cumulativa, é algo que tenho enorme dificuldade em concretizar. Também foi assim quando saí. Ainda hoje não sei por que motivo o fiz; se calhar por simples imitação, pois era o que se fazia na altura, como agora sucede com os meus amigos que regressam. É claro que o ego não se conforma e procuro outra razão, vasculhando entre o que é pouco nobre e o que é prosaico. Ter saudades, por exemplo, é genericamente prosaico. Mas ter - por hipótese - saudades de açorda alentejana até não me desagrada, não me compromete nem compromete outros. E é verdade que tenho saudades de açorda alentejana, mesmo que não seja a explicação verdadeira. Para quê complicar mais? Sim, volto. Volto pela sopa.


E que tal mudares o nome do blogue para "A Verdade dos Factos"?

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